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Em busca do túmulo da família de Noé

No verão de 2003, participei de uma série de conferências bíblicas para ministros adventistas na Armênia, Geórgia e no sul da Rússia. Ao nos dirigirmos de Yerevan, capital da Armênia, para Tiblisi, capital da Geórgia, ao norte, paramos na rodovia para tirar fotografias do Monte Aragatz, a mais alta montanha da Armênia, com 4.400 metros. Essa elevação ergue-se a cerca de 48km ao norte do local tradicional do Monte Ararat, que se localiza no lado oposto da fronteira com a Turquia (ver Figura 1 com o mapa da região).

Certamente os leitores da Bíblia estão familiarizados com a relação entre o Monte Ararat, Noé e o Dilúvio, pois foi “nas montanhas de Ararat” que a arca repousou quando as águas baixaram (Gênesis 8:4). Alguns dias após a Arca ter repousado, “Noé saiu [da arca] juntamente com seus filhos e sua esposa, e esposas de seus filhos”, ofereceu sacrifício de gratidão a Deus, e estabeleceu-se na região (versos 18 e seguintes). “Os filhos de Noé que saíram da arca foram Sem, Cão e Jafé, e deles descenderam os povos que se espalharam sobre a Terra” (Gênesis 9:18 e 19).

Após ter voltado para casa, procurei na Internet fotos mais aproximadas de vários locais no Monte Aragatz.(1) O estudo dessas fotos me convenceu de que havia algumas inscrições cavadas em rocha na encosta sul dessa montanha, logo acima do Lago Qare (a cerca de 2.700m de altitude). Desejando examinar essas inscrições, voltei à Armênia em junho de 2004, acompanhado de um fotógrafo profissional amigo. (2)

Descobertas no Lago Qare

No dia 28 de junho partimos para o Lago Qare, no Monte Aragatz, juntamente com um guia e nosso anfitrião, o presidente da Missão Adventista na Armênia. Uma boa estrada leva até aquele lago, onde se localiza o Instituto de Física da Armênia, onde se estuda os raios cósmicos. Após uma série de atrasos, chegamos ao Lago Qare e descobrimos que lá havia muito mais neve e lama do que havíamos julgado (Figura 2).

Ao chegarmos ao estacionamento existente numa das extremidades do lago, nosso guia nos perguntou para onde desejávamos ir. Apontei-lhe a encosta da montanha mais próxima do estacionamento, onde achei que poderíamos encontrar algumas inscrições. Em vez de seguir uma trilha que parecia ser o caminho mais curto, nossos companheiros sugeriram que seguíssemos outro caminho, margeando o lago. Quando atingimos o ponto extremo, divisei uma grande rocha com cerca de 1,2 por 1,8m. Ao me aproximar notei a figura de uma grande serpente esculpida em sua parte superior. A partir disso reconheci que havíamos descoberto algo, pois nos alfabetos antigos a serpente simboliza a letra N (do Semítico nahash, “serpente”). Também é a primeira letra do nome do Noé bíblico. O restante da inscrição pode ser decifrado como “daqui a pomba bateu asas saindo da arca”.

A identificação da primeira rocha com inscrição incentivou a busca de outras na mesma área. Foram descobertas sete outras rochas com inscrições num raio de oito metros a partir da primeira. Quatro dentre elas são representativas da cabeça de vários membros da família de Noé – Sem, Cão e Jafé. Os homens têm seus nomes inscritos (a leitura é feita da direita para a esquerda), porém os nomes das suas esposas são simplesmente mencionados como “mulher (ashat) de”.

Uma dessas rochas gravadas foi importante para a determinação da natureza do grande monte existente no outro lado do lago. Essa rocha estava assentada horizontalmente, com cerca de dois terços acima do caminho, para demarcar o pico. A efígie de um homem é mostrada no lado direito do pico, tendo a seu lado inscritas duas palavras: Noach, ou seja, Noé, e qeber, isto é, túmulo.

Lendo as inscrições

Observei, pela primeira vez, a inscrição aqui usada no outro lado da fronteira, ao visitar a formação Durupinar, perto de Dougbayazit, na Turquia, no verão de 1998. Foi uma verdadeira surpresa descobrir lá um par de breves inscrições alfabéticas, pois eu havia suposto anteriormente que qualquer escrita que fosse encontrada nessa área próxima ao local em que parou a Arca de Noé, teria de ser cuneiforme. Porém, aqui estava uma escrita alfabética relacionada com o proto-sinaítico, o mais antigo alfabeto da humanidade, conhecido originalmente nas minas de turquesas do Sinai, nos meados do segundo milênio a.C, e descoberto mais recentemente no início do segundo milênio a.C. no Egito. Aqui estava a forma mais antiga desse alfabeto semítico encontrada primeiramente na Turquia oriental e agora na Armênia.

Aquela rocha com a inscrição das duas palavras (Noach qeber, ou túmulo de Noé), parece ser um modelo ou um indicador do monte funerário de Noé, que se encontra no lado oposto do lago, no plano visual da rocha gravada. Infelizmente essa interpretação não me ocorreu a não ser alguns meses após meu retorno para casa.

Uma rocha maior com inscrições, localizada mais próxima à beira do lago, mostra uma cena mais ampla que pode ser decifrada (Figura 3). No canto direito inferior está Noé com sua mão levantada, mostrando estar soltando um pássaro. A pomba (yonah) está acima dele, à direita, enquanto o corvo (oreb) está no outro lado, em cima. No canto esquerdo inferior, oposto a Noé, é mostrada a arca repousando no Ararat. Existem inscrições pouco perceptíveis em cada uma das figuras. Essa cena implica que a montanha sobre a qual a arca pousou era essa, e não outra a 48km ao sul.

Após caminharmos um pouco mais de uma hora, desabou uma tempestade e tivemos de nos retirar prematuramente do local. Não obstante, fomos capazes de conseguir mais do que esperávamos.

O túmulo de Sem

Para meu grande desapontamento, não conseguimos voltar ao Monte Aragatz para explorações posteriores. Entretanto, abriu-se perante nós outro horizonte de pesquisas. Após alguns dias de turismo na área de Yerevan, saímos pela estrada em direção à cidade de Sisian, três horas ao sul de Yerevan. Na manhã de uma sexta-feira, chegamos a três quilômetros ao sul de Sisian, em Zorats Qarer, um grande sítio de megalitos, às vezes chamado de Stonehenge da Armênia. Embora as colunas de pedra em Zorats Qarer não sejam tão altas como as de Stonehenge, na Inglaterra, elas são em maior número e espalhadas cobrindo uma área muito maior (Figura 4). Algum antropólogo ou arqueólogo armênio numerou a maioria delas com tinta branca. A numeração mais alta que vi foi 180, se bem que possa haver um número maior ainda. Elas se espalham ao longo de quase 400 metros em fileiras distintas (Figura 5).

Passamos mais de duas horas fotografando cerca de 60 dessas colunas. Muitas delas têm curtas inscrições em baixo ou alto-relevo, com vários graus de legibilidade devido à ação das intempéries ou do crescimento de líquens. As inscrições legíveis utilizavam o mesmo alfabeto antigo que havíamos visto no Monte Aragatz.

Na ausência de melhor explicação, a interpretação armênia usual desse campo é que ele pode representar antigos referenciais astronômicos semelhantes aos de Stonehenge. Porém, Zoratz Qarer é bastante distinta de Stonehenge, especialmente porque em seu centro encontra-se um túmulo. A pergunta importante, então, é quem está sepultado no túmulo? As inscrições desgastadas pelo tempo provêm a resposta. Numerosas delas referem-se ao túmulo de Sem e sua mulher. Uma das inscrições mais legíveis pode ser vista num dos referenciais (Figura 6). A palavra qeber está inscrita no lado esquerdo da estela, e o nome de Sem está gravado com suas três letras curtas e simples no lado direito, e novamente com letras menores na parte central inferior. Outros nomes masculinos da família de Noé também se encontram aqui, porém sem associação com a palavra que significa “sepultura”. Assim, o importante túmulo no centro desse complexo deveria ser o de Sem e sua mulher (ou sua mulher pode estar sepultada no túmulo secundário logo ao sul do túmulo central). O local está situado aproximadamente a quatro horas ao sul do que, creio eu, deve ser o monte funerário de Noé e sua mulher no Monte Aragatz.

O túmulo de Jafé

Com o nosso espírito consideravelmente impressionado pelas descobertas em Zorats Qarer, fizemos outra excursão a um grande vale, a três horas de distância ao sul de Sisian. Era um vale profundo e descemos até ele por uma estrada cheia de curvas. Lá tomamos um belo banho numa fonte geotermal e subimos pela outra encosta do vale, serpenteando por outra estrada até o Mosteiro Tatev.

Fiquei surpreso ao descobrir mais inscrições referentes a Noé, em três grandes blocos de rocha no pátio do mosteiro. Os monges construtores do mosteiro (em torno do ano 1.000 a.D) preservaram cuidadosamente a parte posterior desses blocos, ao fazerem suas próprias inscrições na parte dianteira. No verso desses três blocos podem ser lidos os nomes de Sem, ao centro, de Cão, à direita, e de Jafé, à esquerda. Não sabemos de onde os monges trouxeram esses antigos blocos de rocha, que foram para nós um presságio da descoberta mais importante que fizemos em nosso itinerário de volta pelo mesmo caminho.

Ao chegarmos à borda norte do vale, nosso anfitrião e motorista disse: “Oh, esqueci de levá-los àquele mirante”. Ao andarmos até o mirante, num promontório (Figura 7), um lugar elevado, notei dois estratos rochosos com as rochas recentes na parte superior formando o local do belvedere, e as rochas antigas mais abaixo. Essas rochas mais antigas tinham inscrições desgastadas pelas intempéries, com relevos semelhantes aos que havíamos visto no Monte Aragatz e no campo dos megalitos em Zoratz Qarer. Dessa vez as inscrições revelaram uma conexão entre a palavra qeber (sepultura, túmulo) e o nome de Jafé, outro dos filhos de Noé.

Esse conjunto de inscrições indica que o promontório não foi estabelecido apenas para o uso dos turistas modernos, mas que em tempos idos serviu como local do sepultamento de Jafé e sua mulher. Enfatizando a conexão do local com a família de Noé, existem inscrições dos seus três filhos no topo das rochas em forma de coluna, logo ao se cruzar a estrada que sai do mirante. Nesse local, Sem e sua mulher estão à direta, Cão e sua mulher ao meio, e Jafé e sua mulher à esquerda.

Resumo

Sintetizando os resultados de nossas explorações na Armênia, pode-se dizer que foram identificados três bons locais como candidatos ao espaço de sepultamento de três homens e suas respectivas esposas:1 Noé e sua mulher, no monte funerário da margem do Lago Qare, na altitude de 2.700 m do Monte Aragatz, a uma hora de carro ao norte de Yerevan;2 Sem e sua mulher, na sepultura do centro do campo de megalitos de Zorats Qarer, a três horas de carro ao sul de Yerevan; e3 Jafé e sua mulher, no promontório acima do vale onde se localiza o Mosteiro Tatev, seis horas ao sul de Yerevan.

São aguardadas outras visitas à área para ampliar e aprofundar os resultados desta pesquisa.

William H. Shea (MD. pela Loma Linda University; Ph.D. pela University of Michigan) foi médico-missionário, professor de seminário e diretor-associado do Biblical Research Institute da Conferência Geral dos Adventistas do Sétimo Dia. Embora aposentado, continua a fazer palestras, viajar e escrever como especialista em línguas antigas. Seu endereço eletrônico é: Shea56080@aol.com

Referências

1. Na Internet, log em www.masis.am, selecionar Mountains, e então Aragatz.

2. Rollin Weber, de Palm Desert, Califórnia, tirou as fotos que acompanham este artigo.


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